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Há alguns anos, fiz um teste de DNA através da saliva com a 23andMe. Além de informações sobre saúde e traços físicos, o exame faz um mapa genético das origens dos ancestrais. Sou uma grande salada de portugueses, italianos e libaneses, com croutons norte-europeus jogados em cima. Fiquei tão fascinado com a descoberta que meu pai, minha mãe e meu irmão fizeram o teste também.
Uma surpresa foi quando o laboratório automaticamente nos conectou, mostrando que compartilhávamos boa parte do DNA; por isso, deveríamos ser parentes. Mais precisamente, filhos, pais e irmãos. Ao mesmo tempo, a tal base de dados indicou várias outras pessoas como possíveis primos (de primeiro, segundo, terceiro graus), tios, etc. Foi como desenterrar uma árvore genealógica. Algumas pessoas meu pai até sabia quem eram, primos dele que foram morar nos EUA e outros no interior de São Paulo.
Entretanto, um dos galhos que surgiu nesta enorme árvore nos foi completamente misterioso. O laboratório sugeria que um senhor na Costa do Marfim fosse sobrinho do meu pai, portanto, meu primo. Achamos muito engraçado e desacreditamos o teste.
Cinco e-mails depois, cá estou no aeroporto de Addis Abeba esperando a conexão para Abidjan, capital da Costa do Marfim. O tal sobrinho do meu pai, Sr. Abel Elias, nos enviou uma mensagem através do laboratório há dois meses. Ele também ficou surpreso com o match genético e, curioso que é, foi atrás de pistas. Foi quando recebemos algumas fotos antigas, da mãe e dos irmãos dele lá na África, que ficou bem claro que havia muito mais do que cromossomos entre nós.
Existe uma grande comunidade libanesa naquela região. Assim como vieram para o Brasil, Argentina e EUA, imigrantes do Oriente Médio se estabeleceram nas então colônias francesas da África Ocidental. Muitos prosperaram e seguiram morando ali após as independências, nos anos 1960. O pai do Sr. Elias foi um deles, mas é a Sra. Elias nosso link. Foi através dela que descobri um dos grandes segredos de família: a filha perdida. Um segredo digno de um livro de Elena Ferrante!
Vou resumir, senão a newsletter vira romance. Quando a família do meu bisavô resolveu imigrar do Líbano para o Brasil, vieram todos, menos minha avó, que era adolescente e tinha problemas de saúde. Ficou sob a responsabilidade das monjas e monges do Mosteiro Carmelita em Hazmieh, nos arredores de Beirute. Levou cinco anos para os Saad irem de Santos para Curitiba, de Curitiba para Guaraúna, de Guaraúna para Ponta Grossa. Só então Charbel, o irmão mais velho, voltou ao Líbano para vender o resto da propriedade deles e pegar Karime.
No mosteiro, Karime engravidou de alguém. Não se sabe se foi abuso ou paixão. Mas, como de costume naquela época, a jovem solteira e grávida teve que entregar o bebê para a igreja assim que ele nasceu. A bebê foi adotada por um casal maronita que imigrou logo em seguida. Não se falou mais sobre o assunto. Anita chegou ao Brasil, juntou-se à família e deu sequência à história que todos nós da família conhecemos.
O Sr. Elias é filho dessa menina adotada. Ao contrário de nós, eles sempre souberam que os avós tinham adotado a mãe, já que ela foi filha única, raridade nas famílias libanesas. Mas a opacidade sempre foi regra nestes assuntos. São sussurros, histórias mal contadas, memórias que esfumaçam. Até que a ciência entra em cena e revela os mais recônditos mistérios.
Vou passar uma semana na casa desse meu primo, que tem 69 anos, mas está bem lúcido. Vou conhecer primas e primos mais velhos. Um primo voltou ao Líbano e tem um restaurante em Jounié onde almocei algumas vezes, pasme! Estou com muitas fotografias na mala, cartas e documentos antigos para compartilhar com eles.
Os parentes daqui estão bem refratários e não querem saber muito dessa história. Engraçado que quando minha tia fez constelação familiar, disseram que ela teria mais irmãos do que pensava. Entre a constelação e o DNA, há mais coisas entre o céu e a terra do que pode imaginar nossa vã filosofia, para terminar com Shakespeare, que adorava intrigas familiares. Vou correr agora. O voo Ethiopian Airlines ET512 está embarcando. Mando fotos assim que encontrar os novos parentes!
🇬🇧 A few years ago, I took a DNA test using saliva with 23andMe. Besides providing information about health and physical traits, the test also creates a genetic map of one's ancestral origins. I am a big mix of Portuguese, Italian, and Lebanese, with some Northern European croutons thrown in. I was so fascinated by the discovery that my father, mother, and brother also took the test.
One surprise was when the lab automatically connected us, showing that we shared a significant portion of DNA, indicating we were indeed relatives—more specifically, children, parents, and siblings. At the same time, the database identified several other people as potential cousins (first, second, third degree), uncles, etc. It was like unearthing a family tree. Some of them my father even recognized, cousins who had moved to the USA and others to the countryside of São Paulo.
However, one branch that appeared on this vast tree was completely mysterious to us. The lab suggested that a man in Ivory Coast was my father's nephew, therefore my cousin. We found it very funny and didn't believe the test.
Five emails later, here I am at Addis Ababa airport, waiting for a connection to Abidjan, the capital of Ivory Coast. My father's so-called nephew, Mr. Abel Elias, sent us a message through the lab two months ago. He was also surprised by the genetic match and, as a very curious man, decided to look for clues. That's when we received some old photos of his mother and siblings in Africa, and it became quite clear that there was much more between us than just chromosomes.
There is a large Lebanese community in that region. Just as they came to Brazil, Argentina, and the USA, immigrants from the Middle East settled in what were then French colonies in West Africa. Many prospered and continued living there after the countries gained independence in the 1960s. Mr. Elias's father was one of them, but it is Mrs. Elias who is our link. It was through her that I discovered one of the family's biggest secrets: the lost daughter. A secret worthy of an Elena Ferrante novel!
I will summarize; otherwise, this newsletter will turn into a novel. When my great-grandfather's family decided to immigrate from Lebanon to Brazil, everyone came along except my grandmother, who was a teenager with health problems. She was left in the care of the nuns and monks of the Carmelite Monastery in Hazmieh, on the outskirts of Beirut. It took five years for the Saad family to move from Santos to Curitiba, from Curitiba to Guaraúna, and from Guaraúna to Ponta Grossa. Only then did Charbel, the eldest brother, return to Lebanon to sell the rest of their property and bring Karime to the new home.
At the monastery, Karime got pregnant. It is not known if it was abuse or love. But, as was customary at that time, the young single pregnant woman had to give the baby to the church as soon as it was born. The baby was adopted by a Maronite couple who immigrated soon after. The matter was never spoken of again. Anita arrived in Brazil, joined her family, and continued the story that all of us in the family know.
Mr. Elias is the son of that adopted girl. Unlike us, they always knew their grandparents had adopted their mother, since she was an only child, a rarity in Lebanese families. But secrecy was always the rule in these matters. There were whispers, poorly told stories, memories that faded away. Until science steps in and reveals the most hidden mysteries.
I will spend a week at the house of this cousin, who is 69 years old but still very lucid. I will meet older cousins. One cousin returned to Lebanon and has a restaurant in Jounieh, where I've had lunch a few times, believe it or not! I have many photographs, letters, and old documents in my suitcase to share with them.
The relatives here are quite reluctant and do not want to know much about this story. It's funny that when my aunt did a family constellation, they said she had more siblings than she thought. Between the constellation and the DNA, there are more things in heaven and earth than our philosophy dreams of, to end with Shakespeare, who loved family intrigues. Have to run now. Ethiopian Airlines flight ET512 is now boarding! I will send photos as soon as I meet then new relatives.
Que história bacana!!
Espero que goste e se divirta muito com os tios e primos novos!!!
Interesting story … I should try to find out more about our family, too. At least one part is German since 1600 - so I was told 😉
Thank you so much !