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No dia em que os computadores do mundo entraram em colapso (19/07/24), eu estava dentro de um avião, sem poder desembarcar no aeroporto de Zurique depois de 12 horas de voo. O capitão avisou: "aeroporto fechado por pane nos sistemas de controle aéreo europeu". Não havia portões disponíveis, nem ônibus, nem escadas. Pensei que talvez fosse um moço de sorte por estar na Suíça justo quando uma pane geral deixa o mundo confuso.
Alguns passageiros conectaram-se à rede e descobriram que Manila, Kuala Lumpur, Istambul, Nova York, Miami, Lisboa... muitos aeroportos estavam com milhares de voos cancelados. A suspeita era um ataque cibernético pré-Olimpíadas. Bancos saíram do ar, alguns canais de TV também. Um medinho começou a crescer dentro de mim, mas a preocupação maior não era com Putin, nem com os hospitais da Escócia. Eu queria mesmo era pegar meu voo de conexão para Nápoles.
Quando a porta do avião finalmente abriu, uma hora depois do pouso, saímos correndo em busca de nossa sorte. Mas tinha uma pedra no meio do caminho. O finger estava fechado. Era como se ninguém no aeroporto soubesse que um Boeing 777 lotado vindo do Brasil tinha pousado e que todos os trezentos e poucos passageiros estavam ali amontoados, atrasados, começando a entrar em pânico com o calor de 30 graus (na Suíça, minha gente) com crianças chorando e gritos desesperados. Para ajudar, as fofocas dos antenados ficavam cada vez mais sombrias: não há ambulâncias, a bolsa de Nova York fechou, cancelaram o Natal. Era como se o fim do mundo estivesse se desenrolando enquanto nós, sem escovar os dentes, descabelados e com o fuso horário virado, estivéssemos num cocoon esperando o bug do milênio ser consertado.
Eu só pensava em Nápoles. Na pizza frita do Sorbillo, no sorvete de pistache do Gay-Odin, na minha prima me esperando no aeroporto e a família em Capri. Quando policiais escutaram o drama dentro daquela sauna-túnel, abriram a porta com uma machadinha e nos despejamos feito água pelos corredores. Olhei nas telas informativas e quase tive um surto ao ver que o voo Zurique-Nápoles era o único; sim, o único azulzinho, pulsando “embarque imediato”. Paris, Tóquio, Sydney, Genebra, Milwaukee, Cidade do Cabo, tudo cancelado e o meu piscando dizendo: venha!!! E fui! Saí correndo como se estivesse numa competição de Crossfit. Como se minha vida dependesse de pegar aquele voo. Pulei por cima de gente amontoada, gritei para abrirem alas que eu queria passar. O oficial de imigração pegou meu passaporte e falou: Welcome to the shitshow! Os saguões pareciam estádio de futebol antes de final de campeonato. Jurei que não pegaria uma daquelas filas quilométricas de remarcação de voos. Quando apareci na frente do portão, esbaforido, suado e tremendo, não conseguia nem abrir o celular com o cartão de embarque. Entrei em colapso, igual aos computadores. Me carregaram para dentro do avião, fecharam a porta e ficamos mais uma hora esperando algo acontecer. Até que decolamos. Uma única aeronave sozinha sobre os Alpes. Um pequeno milagre.
Quem não chegou em Nápoles foi minha mala. Nem minha prima. Ela (a prima) chegou várias horas atrasada, num ônibus que a Alitalia fretou para os passageiros enroscados em Fiumicino. A mala pegou carona numa cauda de cometa e foi passar férias em Mumbai. O que importa é que no dia marcado, estava em frente à Marina Grande de Capri para me juntar à viagem da família, de banho tomado, cabelo cortado, dentes escovados e uma ecobag com uma sunga, um chinelo e algumas camisetas novas. Férias de verão pedem pouca roupa e sei improvisar. E as férias desenrolaram sem grandes solavancos desde então.
Agora que é dia de voltar para casa, trocaram o meu voo. Ativistas ecológicos ocuparam as pistas do aeroporto de Frankfurt. O voo substituto para Munique atrasou e perdi a conexão para o Rio de Janeiro. Estou num hotel do aeroporto torcendo para que amanhã não tenha explosão de vulcão, ativistas, terroristas, bugs, greves, vírus ou outras coisas que empacam nossa vida de viajante. Torço também para a minha mala ter cansado da Índia e já estar a caminho de casa. Nesse meio tempo, tenho uma mala nova recheada de livros, geleias, vinhos, pistaches, azeitonas, salames e a pouca roupa nova que usei até gastar. Se não chegar em casa logo, a cueca nova vai ter que ser jogada no lixo.
Viajar é delicioso, mas é uma atividade cheia de armadilhas, perrengues e desconfortos. Por isso, a frase da sábia Lia, minha mãe, vem sempre a calhar nas horas em que há 86 pessoas na frente da fila de bagagem perdida, ou quando faz uma hora e meia que se escuta Danúbio Azul na linha do call center da companhia aérea: "só acontece com quem viaja”. Minha avó era mais misteriosa, dizia: “quem não abusa, não se lambuza”.
Já me lambuzei bastante por hoje. Agora só quero apertar o “envia” na Newsletter, fechar os olhos e acordar na minha casa, com lavagem intestinal concluída, osteopata agendado e a promessa de uma nova viagem no horizonte.
The day the world's computers crashed (July 19, 2024), I was on a plane unable to disembark at Zurich airport after a 12-hour flight. The captain announced the airport was closed due to a failure in the European air traffic control systems. There were no available gates, buses, or stairs. I thought that maybe I was lucky to be in Switzerland just when a general breakdown left the world confused.
Some passengers got online and found out that Manila, Kuala Lumpur, Istanbul, New York, Miami, Lisbon, and several other airports had thousands of canceled flights. The suspicion was a pre-Olympics cyberattack. Banks went offline, and some TV channels too. A little fear started to grow inside me, but my main concern wasn't with Putin, nor with the hospitals in Scotland. What I really wanted was to catch my connecting flight to Naples.
When the plane door finally opened, an hour after landing, we rushed out into the jet bridge. But there was a stone in our way. The jet bridge was closed. It was as if no one at the airport knew that a fully loaded Boeing 777 from Brazil had landed and that all three hundred or so passengers were crowding, delayed, starting to panic in the 30-degree heat (in Switzerland) with crying children and desperate screaming. To make matters worse, the gossip from the online trolls was getting darker: there were no ambulances, the New York Stock Exchange closed, Christmas was canceled. It was as if the end of the world was unfolding while we, with unbrushed teeth, disheveled hair, and jet-lagged, were stranded in a cocoon waiting for the millennium bug to be fixed.
I was only thinking about Naples. The fried pizza at Sorbillo, the pistachio ice cream at Gay-Odin, my cousin waiting for me at the airport, and the family in Capri. When the police heard the drama inside that sauna-tunnel, they opened the door with a hatchet, and we spilled out like water through the corridors. I looked at the information screens and almost had a fit when I saw that the Zurich-Naples flight was the only one, yes, the only one in blue, pulsating "immediate boarding." Paris, Tokyo, Sydney, Geneva, Milwaukee, Cape Town, all canceled, and mine was flashing saying: come to me, baby!!! And off I went! I ran as if I were in the Crossfit games. As if my life depended on catching that flight. I jumped over people, shouted for them to make way for me. The immigration officer took my passport and said: "Welcome to the shitshow!" The halls looked like a football stadium before a final match. I swore I wouldn't get into one of those kilometer-long flight rebooking lines. When I showed up at the gate, breathless, sweaty, and shaking, I couldn't even open my phone with the boarding pass. I collapsed, just like the computers. They carried me onto the plane, closed the door, and we waited another hour for something to happen. Then we took off. A single aircraft alone over the Alps. A small miracle.
My suitcase didn't make it to Naples. Nor did my cousin. She arrived several hours late on a bus Alitalia chartered for passengers stuck at Fiumicino. My suitcase decided to holiday in Mumbai instead of Italy. What matters is that on the scheduled day, I was in Capri’s Marina Grande ready to join the family trip, freshly showered, teeth brushed, and with an eco-bag containing a swimsuit, flip-flops, and some new T-shirts. Summer holidays require little clothing, and I know how to improvise. The vacation went on without major hiccups since then.
Now it's time to go home, and my return flight was changed. Environmental activists occupied the runways at Frankfurt airport. The substitute flight to Munich was delayed, and I missed the connection to Rio de Janeiro. I am at an airport hotel hoping that tomorrow there won't be a volcano explosion, activists, terrorists, bugs, strikes, viruses, or any other thing to stall a traveler's life. I also hope that my suitcase, tired of India, is already on its way home. In the meantime, I have a new suitcase filled with books, jams, wines, pistachios, olives, salamis, and the few new clothes I used until they wore out. If I don't get home soon, the underwear I am wearing now will have to be thrown away (or burned).
Traveling is delightful, but it's an activity full of pitfalls, hassles, and discomforts. That's why my wise mother's saying always comes in handy when there are 86 people ahead of you in the lost luggage line, or when you’ve been an hour and a half on hold with the airline listening to elevator music: "It only happens to those who travel." My grandmother was more mysterious, saying: “No risk, no reward.”
I've risked enough for today. Now I just want to hit "send" on this newsletter, close my eyes, and wake up at home, with a finished intestinal pump, an osteopath appointment, and the promise of a new trip on the horizon.
Ótima Vi! Mais uma aventura vivida, xom muita emoção e diversão!!! ❤️